QUINHENTISMO E BARROCO


O QUINHENTISMO NO BRASIL: 1500 – 1601

            “Nem crônicas, nem memórias, pois não resultavam de nenhuma intenção literária: os registros dos cronistas e viajantes eram uma tentativa de descrever e catalogar a terra e o povo recém-descobertos. Entretanto, permeava-os a fantasia de seus autores, exploradores europeus que filtravam fatos e dados, acrescentando-lhes elementos mágicos e características muitas vezes fantásticas.”
            O primeiro texto escrito no Brasil, em 1500, a conhecida carta de Pero Vaz de Caminha,  registra, com detalhes, as impressões do “descobrimento” da terra brasileira. Esta carta abre um período de três séculos, chamado de Era Colonial, no qual nossa literatura busca uma identidade própria.
            É difícil precisar o momento exato em que surgiu uma literatura brasileira, uma vez que a vida cultural no período colonial estava diretamente ligada à cultura portuguesa. Além disso não estavam solidificadas as condições necessárias para a literatura florescer e se expandir, tais como existência de um público leitor ativo e influente, grupo de escritores atuantes, vida cultural rica e abundante, sentimento de nacionalidade, imprensa, gráficas e liberdade de expressão. Até mesmo a impressão de livros era proibida.
            Assim, a produção literária do Brasil-Colônia costuma  ser chamada de “manifestações literárias” ou  “ecos da literatura no Brasil.” A consolidação de uma literatura brasileira deu-se no século XIX, após a independência política(1822), com o Romantismo.

CONTEXTO HISTÓRICO BRASILEIRO

          Conquista e colonização(1530);
          Destruição da cultura indígena;
          Economia portuguesa predatória: extração do pau-brasil e exploração do índio;
          Chegada dos primeiros escravos africanos(1548);
          Governo Geral e chegada dos jesuítas:1549;



LITERATURA DOS JESUÍTAS

            A produção literária dos jesuítas tinha como objetivos a conquista espiritual, a catequese e a devoção. Para isso utilizaram-se da poesia, do teatro e da transmissão de alguns conhecimentos básicos, como ler, escrever e contar.
            A cultura indígena foi suplantada pela visão de mundo dos jesuítas, marcada pela religiosidade medieval.
            A dança e a música dos dominados(negros e índios) foram as únicas manifestações artísticas que deixaram sua marca no processo de transplantação cultural.
            O principal escritor jesuíta dessa fase foi o padre  José de Anchieta.

TEXTO 01: Caminha relata a recepção dada por Cabral a dois indígenas:

            “... Mostraram-lhes um papagaio pardo que o capitão traz consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como quem diz que os havia ali. Mostraram-lhes  uma galinha: quase tiveram medo dela: não lhe queriam pôr a mão; e depois a tomaram como que espantados.
            Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis, mel e figos passados. Não quiseram comer quase nada daquilo; e, se alguma coisa provaram, logo a lançaram fora.
            Viu um deles umas contas de rosário, brancas; acenou que lhas dessem, folgou com elas e lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar do capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo. Isto tomávamos nós por assim o desejarmos. Mas se ele queria dizer que levaria a conta e mais o colar, isto não o queríamos nós entender, porque não lho havíamos de dar. E depois tornou as contas a quem lhas dera.
            Então estiraram-se de costas na alcatifa, a dormir, sem buscarem maneira de encobrir suas vergonhas(...). O capitão lhes mandou pôr por baixo das cabeças seus coxins, e o da cabeleira esforçava-se por a não quebrar. E lançaram-lhes um manto por cima; e eles consentiram, quedaram-se e dormiram.”


TEXTO 02: A Carta de Pero Vaz – Murilo Mendes(escritor  modernista):

A terra é mui graciosa,                              
Tão fértil eu nunca vi.                               
A gente vai passear,                                 
No chão espeta um caniço,                     
No dia seguinte nasce                             
Bengala de castão de oiro.                      
Tem goiabas, melancias,                         
Banana que nem chuchu.                                  
Quanto aos bichos, tem-nos muitos,     
De plumagens mui vistosas.       
Tem macaco até demais
Diamantes tem à vontade
Esmeralda é para os trouxas.
Reforçai, Senhor, a arca,
Cruzados não faltarão,
Vossa perna encanareis,
Salvo o devido respeito.
Ficarei muito saudoso
Se for embora daqui.


TEXTO 03: Gândavo descreve as frutas existentes:

            “... Uma planta se dá também nesta Província, que foi da Ilha de São Tomé, com a fruita da qual se ajudam muitas pessoas a sustentar na terra. Esta planta  é mui tenra e não muito alta, não tem ramos senão umas folhas que serão seis ou sete palmos de comprimento. A fruita dela se chama banana. Parecem-se na feição com pepinos e criam-se em cachos (...). Esta fruita é mui saborosa, e das boas que há na terra: tem uma pele como de figo(ainda que mais dura) a qual lhe lançam fora quando a querem comer: mas faz dano à saúde e causa fevre a quem se desmanda nela.”

TEXTO 04: Erro de Português – Oswald de Andrade (poeta modernista)

          Quando o português chegou      
          Debaixo duma bruta chuva         
          Vestiu o índio                                 
          Que pena!
Fosse uma manhã de sol
          O índio tinha despido
          O português.


O BARROCO

            Convivendo com o sensualismo e os prazeres materiais trazidos pelo Renascimento, os valores  espirituais – tão fortes na Idade Média e desprezados pela concepção renascentista – voltaram a exercer forte influência sobre a mentalidade  da época. Uma nova onda de religiosidade foi trazida pela Contra-Reforma e pela fundação da Companhia de Jesus. O que decorreu daí foram, naturalmente, sentimentos contraditórios, já que o homem estava dividido entre valores opostos. A arte barroca, que exprime essa contradição, igualmente oscila entre o clássico pagão e o medieval cristão, apresentando-se, então, como uma arte indisciplinada.


O BARROCO NO BRASIL: 1601 – 1768

            Os primeiros textos literários escritos por brasileiros no Brasil-Colônia surgem num momento em que o Barroco europeu se desenvolve e se expande. As condições da colônia, no entanto, diferem bastante das cortes européias luxuosas e, por isso, o Barroco adquire, entre nós,  características específicas, tendo como marco inicial a obra Prosopopéia(1601), de Bento Teixeira, uma espécie de cópias de Os Lusíadas.
            Aqueles que escreviam encontraram na literatura um instrumento para criticar e combater a mentalidade de egoísmo e ganância que prevalecia na colônia, para moralizar a população com os princípios da religião católica ou ainda para dar vazão aos seus sentimentos pessoais  mais profundos. Gregório de Matos, por exemplo, o maior nome do Barroco brasileiro, divide suas atenções entre os modelos do Barroco europeu e a crítica e a sátira da realidade baiana na qual viveu, chocando os  valores e a falsa moral da sociedade, utilizando, inclusive, em algumas obras, um vocabulário de baixo calão, ignorando o poder das autoridades políticas e religiosas.

PRINCIPAIS TEMAS BARROCOS:

          O sobrenatural;
          A morte como expressão máxima da efemeridade das coisas;
          Fugacidade da vida e das coisas;
          Castigo;
          O tempo visto como agente da morte e da dissolução das coisas;
          Erotismo; Misticismo; Arrependimento;
          Cenas trágicas; Apelo à religião.


CARACTERÍSTICAS DA LINGUAGEM BARROCA

·         Requinte formal: construções sintáticas elaboradas, vocabulário de alto nível, a fim de agradar ao seu público consumidor, a aristocracia.

·         Figuração: em vez de dizer as coisas de maneira direta e objetiva, o texto barroco prefere o uso de figuras: metáforas, comparações, símbolos, alegorias, etc..;

·         Conflito espiritual:  o homem barroco sente-se dilacerado e angustiado diante da alteração dos valores, dividindo-se entre o mundo material e o espiritual. Para exprimir esta confusão, o escritor barroco utiliza a antítese e o paradoxo, figuras de linguagem que indicam contradição ou oposição.

·         Temas contraditórios: gosto pela confrontação violenta de temas opostos: amor/dor; vida/morte; juventude/velhice; pecado/perdão.

·         Efemeridade do tempo e carpe diem: o homem barroco tem consciência de que a vida terrena é efêmera, passageira, e, por isso, é preciso pensar na salvação espiritual. Por outro lado, já que a vida é passageira, sente, ao mesmo tempo, desejo de curti-la antes que acabe, o que resulta num sentimento contraditório, já que curtir a vida implica pecar, e, se há pecado, não há salvação.

·         Cultismo: é o rebuscamento formal, caracterizado pelo jogo de palavras e pelo excessivo emprego de figuras de linguagem, explorando efeitos sensoriais, como cor, tom, forma, volume, sonoridade, imagens violentas e fantasiosas, enfim, recursos que sugerem a superação dos limites da realidade.

·         Conceptismo: jogo de idéias constituído pelas sutilezas do raciocínio e do pensamento lógico, por analogias, etc..


PRINCIPAIS FIGURAS DE LINGUAGEM EXPLORADAS PELO BARROCO

Metáfora: é uma comparação abreviada; através dela o poeta revela semelhanças profundas que descobre na realidade: “As aves, que eram no bosque, / Clarins de plumas animadas.”

Antítese: reflete a contradição, o dualismo e a luta de forças opostas, típicas do barroco: “O prazer com a pena se embaraça.”

Paradoxo: duas idéias contrárias num único pensamento: “Rio de neve em fogo convertido.”

Hipérbole: traduz a grandiosidade e o exagero do estilo barroco: “... Outro mar mais copioso / Largando dos meus olhos a corrente...”

Prosopopeia: personificação de seres inanimados: “Agora que se cala o surdo vento.”

TEXTO 01:  A Jesus Cristo Nosso Senhor - Gregório de Matos Guerra

Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Antes, quanto mais tenho delinquido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado.
Se basta a vos irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa, que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida já cobrada,
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na Sacra História:
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,
Cobrai-a; e não queirais, Pastor Divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.

TEXTO 02 – PICA FLOR – GREGÓRIO DE MATOS

Se Pica-Flor me chamais,
Pica-Flor aceito ser,
Mas resta agora saber,
Se no nome que me dais,
Metei a flor que guardais
No passarinho melhor!
Se me dais este favor,
Sendo só de mim o Pica,
E o mais vosso, claro fica,
Que fico então Pica-Flor.


TEXTO 03: Neste fragmento do Padre Antônio vieira, ele procura persuadir seus ouvintes a não se envolverem com idéias de reforma religiosa (o Protestantismo).

            “A uns mártires penduravam pelos cabelos, ou por um pé, ou por ambos, ou pelos dedos polegares, e assim, no ar, despidos, batiam e martelavam com tal força e continuação, os cruéis e robustos algozes, que ao princípio açoitavam os corpos, depois desfiavam as mesmas chagas, ou uma só chaga até que não tinha já que açoitar nem ferir. A outros estirados e desconjuntados no ecúleo, ou estendidos na catasta aravam ou cardavam os membros com pentes e garfos de ferro, a que propriamente chamavam escorpiões, ou metidos debaixo de grandes pedras de moinho, lhes espremiam como em lagar o sangue, e lhes moíam e imprensavam os ossos, até ficarem uma pasta confusa, sem figura, sem semelhança do que dantes eram. A outros cobriam todos de pez, resina e enxofre, e ateando-lhes o fogo, os faziam arder em pé como tochas ou luminárias, nas festas dos ídolos, esforçando-os para este suplício como lhes dar a beber chumbo derretido.”

TEXTO 04:  Neste fragmento de Gregório de Matos, ele apresenta uma violenta crítica a sociedade de sua época, em especial ao governador da Bahia (seu desafeto) e ao clero.

Que falta nesta cidade? ... Verdade       
Que mais por sua desonra...Honra                    
Falta mais que se lhe ponha... Vergonha.       

O demo a viver se exponha,                    
por mais que a fama a exalta,                 
numa cidade, onde falta                          
Verdade, Honra, Vergonha.                    

Que vai pela clerezia?... Simonia
E pelos membros da Igreja?... Inveja
Cuidei, que mais se lhe punha...Unha.

Sazonada caramunha!
enfim que na Santa Sé
o que se pratica é
Simonia, Inveja, Unha.




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