A POESIA MARGINAL DOS ANOS 60/70 – GERAÇÃO MIMEÓGRAFO
Esse movimento surgiu na década de 70 no Brasil e
influenciou diretamente na produção cultural do país.
Leminski, um
dos grandes representantes dessa geração, define o termo marginal:
“Marginal
é quem escreve à margem,
deixando
branca a página
para
que a paisagem passe
e
deixe tudo claro à sua passagem.
Marginal,
escrever na entrelinha,
sem
nunca saber direito
quem
veio primeiro,
o
ovo ou a galinha”.
Esse movimento dito "marginal" absorveu o grito
silenciado pela ditadura militar por meio da união de diversos artistas, “agitadores
culturais”, educadores e professores. Assim, ele permitiu uma nova forma de
divulgação da arte e da cultura brasileira, reprimida pelo sistema totalitário
que vigorava no país.
Inspirado nos movimentos de
contracultura, a denominação “Geração
Mimeógrafo” remete justamente à sua principal característica. Ou seja, a
substituição dos meios tradicionais de circulação de obras para os meios
alternativos de divulgação. Estes eram empregados pelos artistas independentes
ou os “representantes da cultura
marginal”.
Foi assim que os artistas
envolvidos sentiram a necessidade de se expressarem e, sobretudo, divulgarem
suas ideias.
A partir desse movimento
revolucionário literário, a produção poética “fora do sistema” foi divulgada pelos próprios poetas a partir de
pequenas tiragens de cópias.
Elas eram produzidas nos toscos folhetos mimeografados, os quais vendiam sua arte a baixo custo, nos bares, praças, teatros, cinemas, universidades, etc.
A
poesia marginal era formada, em sua maioria, por pequenos textos, alguns com
apelo visual (fotos, quadrinhos, etc.), absorvidos por uma linguagem coloquial
(traços da oralidade), espontânea, inconsciente.
A temática cotidiana e
erótica era permeada de sarcasmo, humor, ironia, palavrões e gírias da
periferia.
Numa das vertentes desse
movimento sociocultural e artístico, surge notadamente a “Poesia Marginal”,
aquela da periferia, representando assim, a voz da minoria.
Os
poetas marginais recusavam qualquer modelo literário, de forma que não se
“encaixavam” em nenhuma escola ou tradição literária.
Desse movimento marginal surgem poetas que se destacaram
como: Chacal, Cacaso, Paulo Leminski e
Torquato Neto.
No campo musical,
destacam-se Tom Zé, Jorge Mautner e Luiz
Melodia. Já nas artes plásticas foram Lygia
Clark e Hélio Oiticica que se identificaram com o movimento.
Uma das frases mais
conhecidas do artista Hélio Oiticica demonstra sua proximidade com a Geração
Mimeógrafo: “Seja Marginal Seja Herói”
PRINCIPAIS
POETAS E OBRAS
Cacaso
(1944-1987)
Antônio
Carlos Ferreira de Brito, conhecido como Cacaso, foi escritor,
professor, crítico e letrista.
Poeta mineiro nascido em
Uberaba, Cacaso foi um dos maiores representantes da poesia marginal. Sua voz
colaborou com o grito de liberdade que o país almejava diante da repressão
causada pela ditadura.Podemos notar essa temática expressa em muitos de seus
versos, por exemplo no poema “Lar doce lar”:
“Minha pátria é minha infância: por isso vivo
no exílio”.
Deixou um grande legado para a literatura brasileira, com
mais de 20 cadernos, alguns em forma de diários, com poemas, fotos e
ilustrações.
Algumas
obras que merecem destaque:
A palavra cerzida (1967)
Grupo escolar (1974)
Beijo na boca (1975)
Segunda classe (1975)
Na corda bamba (1978)
Mar de mineiro (1982)
Chacal
(1951)
Nascido no Rio de Janeiro, o
nome “Chacal” é pseudônimo de Ricardo de Carvalho Duarte. Ao lado de
Cacaso, destacou-se como poeta marginal na Geração
Mimeógrafo.
Poeta e letrista brasileiro,
Chacal mimeografou sua obra “Muito Prazer” em 1971. Outras de suas obras que
merecem destaque são:
Preço da Passagem (1972)
América (1975)
Quampérius (1977)
Olhos Vermelhos (1979)
Boca Roxa (1979)
Tontas Coisas (1982)
Drops de Abril (1983)
Comício de Tudo (1986)
Letra Elétrika (1994)
Belvedere (2007)
Paulo Leminski (1944-1989)
Poeta curitibano e grande representante da poesia marginal, Paulo Leminski Filho foi escritor, crítico literário, tradutor e professor. Escreveu contos, poemas, haicais, ensaios, biografias, literatura infanto-juvenil, traduções e, além disso, realizou parcerias musicais. Publicou seus primeiros poemas na revista concretista “Invenções” e colaborou com outras revistas de vanguarda.
Algumas de suas obras que merecem destaque são:
Catatau (1976)
Curitiba
Etcetera (1976)
Não fosse isso e era menos/ não fosse tanto e era quase
(1980)
Caprichos e relaxos (1983)
Jesus (1984)
Distraídos Venceremos (1987)
Agora É que São Elas (1984)
Metamorfose, uma viagem pelo imaginário grego (1994)
Francisco
Alvim (1938)
Poeta mineiro nascido em
Araxá, Francisco Soares Alvim Neto é
escritor e diplomata brasileiro. Destacou-se na poesia marginal com poemas
curtos e uma linguagem coloquial. Fez parte do grupo inicial dos poetas
marginais “Frenesi”, ao lado de Cacaso e Chacal. Algumas obras que se
destacaram:
Sol dos Cegos (1968)
Passatempo (1974)
Dia sim dia não (1978)
Festa e Lago, Montanha (1981)
Poesias Reunidas (1988)
O Elefante (2000)
O Metro Nenhum (2011)
Poeta piauiense, Torquato Pereira de Araújo Neto foi
escritor, jornalista, cineasta (ator e diretor) e letrista de música popular. Organizou
a revista de poesias vanguardistas “Navilouca”
(1974) e participou dos movimentos de contracultura como a Tropicália, o Concretismo e a Poesia
Marginal.
Nas palavras do artista:
“Escute,
meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é estar sempre a perigo
sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando dificuldades pelo menos
maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela (…). Quem não se arrisca não
pode berrar”.
Sua obra que mais se destacada, disposta em dois volumes
é: “Torquatália: do lado de dentro” e
"Geleia Real”, publicada postumamente, em 2005. Com apenas 28,
Torquato cometeu suicídio na cidade do Rio de Janeiro.
Ana
Cristina César (1952-1983)
Poetisa, tradutora e crítica literária carioca, Ana Cristina César é considerada uma das principais figuras femininas
da geração mimeógrafo. Suas publicações de edições independentes que
merecem destaque são: “Cenas de Abril” e “Correspondência Completa”.
Além dessas, outras obras que se destacaram:
Luvas de Pelica (1980)
Literatura não é documento (1980)
A Teus Pés (1982)
Inéditos e Dispersos (1985)
Ana se suicida no Rio de
Janeiro quando tinha 31 anos, se atirando da janela de seu quarto .
Nicolas
Behr (1958)
Nicolas
Behr
é um poeta brasileiro nascido em Cuiabá. Foi um grande representante da Geração
mimeógrafo e da Poesia Marginal. Lançou sua primeira obra mimeografada em 1977,
intitulada “Iogurte com farinha”.
Outras obras que merecem destaque são:
Grande Circular (1978)
Caroço de Goiaba (1978)
Chá com Porrada (1978)
Com a Boca na Botija (1979)
Brasiléia Desvairada (1979)
L2 Noves Fora W3 (1980)
Porque Construi Braxília (1993)
Segredo Secreto (1996)
Umbigo (2001)
Rápido
e Rasteiro (Chacal)
Vai
ter uma festa
que
eu vou dançar
até
o sapato pedir pra parar.
aí
eu paro
tiro
o sapato
e
danço o resto da vida.
Cogito (Torquato
Neto)
pronome
pessoal
intransferível
do
homem que iniciei
na
medida do impossível
eu
sou como eu sou
agora
sem
grandes segredos dantes
sem
novos secretos dentes
nesta
hora
eu
sou como eu sou
presente
desferrolhado
indecente
feito
um pedaço de mim
eu
sou como eu sou
vidente
e
vivo tranquilamente
todas
as horas do fim.
Soneto
(Ana Cristina César)
Pergunto
aqui se sou louca
Quem
que saberá dizer
Pergunto
mais, se sou sã
E
ainda mais, se sou eu
Que
uso o viés pra amar
E
finjo fingir que finjo
Adorar
o fingimento
Fingindo
que sou fingida
Pergunto
aqui meus senhores
quem
é a loura donzela
que
se chama Ana Cristina
E
que se diz ser alguém
É
um fenômeno mor
Ou
é um lapso sutil?
Receita
(Nicolas Behr)
Ingredientes:
2
conflitos de gerações
4
esperanças perdidas
3
litros de sangue fervido
5
sonhos eróticos
2
canções dos beatles
Modo de preparar
dissolva
os sonhos eróticos
nos
dois litros de sangue fervido
e
deixe gelar seu coração
leve
a mistura ao fogo
adicionando
dois conflitos de gerações
às
esperanças perdidas
corte
tudo em pedacinhos
e
repita com as canções dos beatles
o
mesmo processo usado com os sonhos
eróticos
mas desta vez deixe ferver um
pouco
mais e mexa até dissolver
parte
do sangue pode ser substituído
por
suco de groselha
mas
os resultados não serão os mesmos
sirva
o poema simples ou com ilusões.
https://www.todamateria.com.br/poesia-marginal/
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