CONCRETISMO, NEOCONCRETISMO E POESIA SOCIAL


CONTEXTO HISTÓRICO

No início dos anos de 1950, quando os poetas concretistas brasileiros começam a se agrupar em torno da revista Noigandres, os países da Europa começavam a se recuperar do trauma da Segunda Guerra Mundial. Iniciava-se um período de reestruturação geográfica, política e econômica.

No Brasil, vivia-se uma época de rápida modernização e intenso crescimento econômico, sobretudo no governo de Juscelino Kubitschek (1956-1960), cuja propaganda oficial prometia um avanço de "cinquenta anos em cinco". O Plano de Metas de Juscelino resultou em impressionante crescimento da indústria de bens de consumo duráveis, com expansão do emprego e da renda dos brasileiros. O desenvolvimento, as grandes realizações, como a construção de Brasília, e a estabilidade política contribuíram para criar a atmosfera de otimismo dos chamados "anos dourados".

A poesia concreta, segundo Philadelpho Menezes, estava "intimamente associada ao movimento de “boom” desenvolvimentista do país, simbolizado exemplarmente pela construção de Brasília, uma nova cidade idealizada como centro do poder, matematicamente situada no centro geográfico do país. Basta recordar que o principal texto da poesia concreta, publicado em 1958, tem o título Plano Piloto para Poesia Concreta, assinado por Augusto de Campos (1931), Haroldo de Campos (1929-2003) e Décio Pignatari (1927-2012). É uma citação direta e assumida do Plano Piloto para a Construção de Brasília, elaborado por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, que sonhava construir, do nada, em meio ao inóspito cerrado do Planalto Central do Brasil, uma cidade dentro dos moldes mais racionalistas idealizados pelo urbanismo modernista europeu.

"Nas artes e na arquitetura o moderno é consagrado. Niemeyer, Lúcio Costa, Reidy e outros fundam um novo cânone arquitetônico, pontuando a vida urbana com símbolos do futuro planejado (...). A música é a Bossa Nova, o cinema é o Cinema Novo. Nas artes e na poesia, o Concretismo assinala o sentido do moderno, ditando as normas da ruptura."[

 

Na literatura, o Concretismo foi um movimento artístico surgido na década de 1950 que extinguia os versos e a sintaxe normal do discurso, dando grande importância à organização visual do texto, com o intuito de acabar com a distinção entre forma e conteúdo e criar uma nova linguagem. Seus princípios, de certa forma, dialogam com as proposições do Cubismo aplicadas tanto à literatura quanto às artes plásticas.

O lançamento oficial do Concretismo brasileiro ocorreu na Exposição Nacional de Arte Concreta, em 1956, no Museu de Arte Moderna em São Paulo. Nesse evento, artistas nacionais de vanguarda — das artes visuais e da poesia concreta — apresentaram suas obras. Nessa exposição, foram mostrados cartazes-poemas, pinturas, desenhos e esculturas de diversos artistas.

Noigandres é o nome de um grupo criado em 1952, em São Paulo, formado por poetas como Haroldo de Campos, Décio Pignatari e Augusto de Campos. É também o título da revista criada por esse grupo, cujos integrantes são responsáveis pelo surgimento da poesia concreta brasileira. Para eles, a poesia deveria refletir a sociedade moderna, de forma a unir o experimentalismo formal à crítica da realidade.

 

CARACTERÍSTICAS DA POESIA CONCRETA

Experimentação formal ou estrutural;

Quebra radical com a poesia lírica;

Oposição à poesia intimista;

Valorização da materialidade das palavras;

Caráter verbivocovisual: palavra, som e imagem;

Ausência de versos e estrofes;

Signo visual e plurissignificativo;

Uso de elipses;

Defesa do poema-objeto;

Ressignificação do espaço em branco da página;

Exploração do espaço da página;

Preocupação com a ordenação das palavras;

Disposição não linear dos vocábulos;

Autonomia estética: independe de subjetividades;

Exploração da metalinguagem.

 

NEOCONCRETISMO

Em 1959, com a publicação do Manifesto Neoconcreto, alguns artistas realizaram uma ruptura com o Concretismo. Entre eles, estava o poeta Ferreira Gullar, que assim caracterizava a nova estética:

 

Arte interativa: participativa;

Poema não objeto: somente se realiza ao ser lido;

Antipositivismo: contra os excessos racionais concretistas;

Expressionista: em oposição à objetividade;

Poesia temporal: contrária à universalidade concreta.

 

Em suma, o que diferencia essa nova estética da anterior, ou seja, do Concretismo, é a interação entre obra e receptor, associada à expressão do artista — elementos que, segundo os neoconcretos, estariam ausentes no Concretismo. Um exemplo são os livros-poemas de Ferreira Gullar. Neles, o sentido da obra vai se construindo à medida que o leitor passa as páginas, as quais, às vezes, assumem formatos especiais de acordo com a intenção expressiva do poeta.


POESIA SOCIAL

Apresenta-se como uma verdade inquestionável afirmar que os chamados “estilos de época”, “escolas literárias”, enfim, estabelecem entre si um diálogo constante, ora se complementando, ora se contrapondo. Nesse sentido, a poesia social surgiu como uma espécie de manifestação, cujo alvo principal era se posicionar contra o radicalismo manifestado pelo movimento concretista. Este, por sua vez, tanto cultuou tal aspecto, que concebeu o poema como a palavra-objeto, centrada em si mesma, cuja expressão não se manifesta pelo discurso propriamente dito, mas sim pelo aspecto visual, geométrico.

Em face dessa questão, torna-se impossível conceber tais manifestações como subjetivas, visto que se trata de algo fechado, isento de múltiplas possibilidades de interpretação. Depois dela, surgiu, então, a poesia social para contradizer tudo aquilo que se fazia visto por intermédio da arte concretista.

A poesia social foi muito bem representada por Thiago de Mello, Ferreira Gullar e Afonso Romano de Sant’Ana. Eles, por meio de suas habilidades artísticas, reestabeleceram o lirismo e fizeram da palavra um instrumento de denúncia social, de revelação das mazelas que assolavam a sociedade da época em que viveram.

Assim, participando ativamente dessas questões, optaram por utilizar uma linguagem simples, que se aproximava do cotidiano, como bem nos demonstra o mestre Ferreira Gullar, em uma de suas criações:

 

Entre lojas de flores e de sapatos, bares,

mercados, butiques,

viajo num ônibus Estrada de Ferro - Leblon.

Viajo do trabalho, a noite em meio,

fatigado de mentiras.

 

O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,

relógios de lilazes, concretismo,

neoconcretismo, ficções da juventude, adeus,

que a vida

eu a compro à vista aos donos do mundo.

Ao peso dos impostos, o verso sufoca,

a poesia agora responde a inquérito

policial-militar.

 

Digo adeus à ilusão

Mas não ao mundo. Mas não à vida,

meu reduto e meu reino.

Do salário injusto,

da punição injusta,

da humilhação, da tortura,

do terror,

retiramos algo e com ele construímos

um artefato, um poema,

uma bandeira.

 

Inferimos que, por meio da expressão “Adeus, Rimbaud”, o poeta denuncia o que tanto pregaram os modernistas: o desejo de uma literatura autenticamente nacionalista, como forma de desapego às importações.

 

Do salário injusto,

da punição injusta,

da humilhação, da tortura,

do terror,

retiramos algo e com ele construímos

um artefato, um poema,

uma bandeira.

 

Tais versos denunciam a indignação antes promulgada: a denúncia que se faz da realidade social, manifestada pelas desigualdades sociais. Assim como em outro de seus poemas, a intenção não se difere desta:   

 

O preço do feijão

não cabe no poema. O preço do arroz

não cabe no poema.

 

Não cabem no poema o gás

a luz o telefone

a sonegação

do leite

da carne

do açúcar

do pão

 

[...]

 

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